É preciso deixar morrer. É preciso aprender a liberar o que já não é mais. Há partes de nós que resistem, apesar de obsoletas. Que certezas carregamos sem questionar? Onde estão nossas dificuldades de aceitação que não nos permitem sair do sofrimento?
Há um tempo para tudo na vida. A semente do que fomos, as ilusões nas quais construímos nossa visão de mundo, foram uma etapa necessária da existência, mas chega o momento da transformação. Aquilo que era bom não representa mais o futuro. A segurança não pode ser medida pela convicção, mas pela habilidade de duvidar e mesmo assim ser capaz de seguir em frente.
Há o momento de deixar a lagarta morrer. Este é o tempo da crisálida. Quando saímos das certezas aprendidas para as verdades elementais. Tornar-se crisálida não é uma experiência isenta de tumulto. A crisálida contém a lagarta, mas vai além dela, muito além.
Essa interiorização a que a crisálida convida é um estado reflexivo, de harmonização entre o ser e o fazer, entre o desejo e o destino. É a edificação da consciência em estado de maturidade. Loucura é permanecer lagarta. Arrastar-se por aí, sem perceber a magnificência da vida. Não precisamos ser outra pessoa para nos transformarmos. O ser que somos já basta. É tempo de se voltar para o interior, para a essência.
O que é percebido como perda, pode na verdade ser um desapego libertador. Do aparentemente frágil é que surge a força, o vigor, a vida. Uma vez que a lagarta comece a se transformar já não há mais volta. E é desse recolhimento, dessa auto imolação do passado que surgirão as condições para o desabrochar de uma nova experiência, mais ampla, mais rica, além de qualquer aspiração.
Da antiga lagarta se tem a experiência do corpo. Dos desafios vividos nascem as antenas da percepção. Da entrega surge o veludo e as cores. O ser se apresenta além das restrições e, de par em par, desdobra suas asas e se permite voar.
Dulce Magalhães In memoriam
Foi filósofa, educadora, escritora, palestrante e Coach.